A formação do psicanalista e a clínica no século XXI

Postado em 2 de julho de 2018

Quando os alunos chegam para a primeira aula de psicanálise, muitas dúvidas os acompanham, as mais comuns talvez sejam: o que é ser um psicanalista e qual sua atuação? Qual a diferença da formação do analista e do psicólogo? Quais as condições para participar de um curso de psicanálise?
Para tentar responder essas questões vou me valer da fala do professor e psicanalista Dr. Jorge Forbes, que afirma que a psicanálise não é uma prática, e sim uma práxis, portanto não visa atingir uma verdade escondida e revelada através da interpretação, mas produzir com a palavra, através do ato analítico, um efeito de elaboração e mudança de posição daqueles que demandam uma interpretação de seus sintomas.
A psicanálise se estabelece como um campo de investigação e intervenção a partir da publicação do livro de Freud “A Interpretação dos Sonhos” no ano de mil e novecentos, propondo-se como uma ciência do psíquico e do campo do inconsciente, como um saber que o sujeito efetivamente não sabia que sabia. Um lugar da dolta ignorância.
A partir de sua criação também surgem questões sobre a formação do psicanalista. Freud acreditava que a psicanálise não deveria ficar apenas nas mãos dos médicos, pois ela não era uma especialização do campo da medicina. Desde Freud até Lacan muita água passou por debaixo desse divã psicanalítico. E por falar nesse acessório fundamental de um analista, é ele o que diferencia a formação de um analista de outro profissional da área psi, ou seja, sua passagem pelo divã. A formação do psicanalista é singular, pois passa por sua própria análise e pela responsabilidade com seu inconsciente e com seu desejo, e somente depois disso será possível sustentar sua posição de analista e trabalhar o desejo do outro. Essa é uma condição “sine qua non” da psicanálise. “Um analista se faz no divã”, afirmava Lacan.
Então, não é o desejo de “ser” analista que sustenta o percurso de sua formação, mas o desejo do analista, que não é da ordem do curar, do fazer, do conselho, das normas e muito menos da moral vigente. O desejo do analista, como afirma Forbes, na via de Lacan, é fazer aquele que demanda uma análise descobrir aquilo que o faz diferente, singular e de responsabilizar-se por essa máxima diferença. O caminho que cada um vai fazer nesse percurso psicanalítico também é único e singular, portanto não há regras nem normas. A psicanálise tem uma teoria científica, mas a clínica psicanalítica é da ordem da invenção, da criação e da responsabilidade, portanto é arte e não ciência. Retomando Freud, um analista nem governa, nem educa, supostamente analisa!
Para chegar a esse percurso da singularidade e da responsabilidade pela máxima diferença, a única norma é quebrar a expectativa do todo, da completude, da inteireza e da paixão romântica de que um dia teremos um perfeito equilíbrio de nossas emoções. A arte, a criação e a invenção de algo novo não vêm do equilíbrio, vêm da coragem de encarar os medos e o caos.
É fundamental para um estudante de psicanálise o famoso tripé: teoria, análise e supervisão. Isso se deve, pois sua clínica vai exigir dele que coloque algo de si, ao fato de colocar seu corpo e seu desejo na relação analítica, que esteja presente e saiba ler a posição de seu analisando, dirigindo a análise do começo ao fim.
Portanto, a formação de um analista nunca termina. E só assim poderá emprestar sua palavra, seu corpo e seu ser para que o analisando consiga atravessar seus abismos em busca de sua singularidade.

Maria Odete G. Galvão
Historiadora, psicóloga e psicanalista, Mestre em semiótica psicanalítica pela PUC/SP, e coordenadora do Núcleo de Pesquisa em Psicanálise, Arte e Cultura de Arujá
Fone: 4653-6691 / 97100-5253
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